sábado, 17 de novembro de 2007, 21:25 | Online
Conheça a Fazenda Yuba, um pedacinho de Japão localizado a 600 quilômetros de São Paulo
Maíra Watanabe Falseti, do estadao.com.br

Alexandre Souza/Diário da Região/AE
Menino brinca sobre uma escultura de Hisao Ohara. Ao fundo, o Memorial Kitahara Wako
Mudanças
Recentemente, a comunidade teve de se tornar uma associação para poder administrar melhor a terra, as atividades e as finanças. "O dinheiro arrecadado com a venda dos produtos é dividido de acordo com as necessidades de cada um", diz o presidente da associação, Tsuneo Yuba, de 53 anos.
A divisão de trabalho, porém, não muda há anos – foi preciso apenas criar uma seção de Vendas. É por meio desse setor que a comunidade se liga com o mundo externo. Antes, parte da produção era vendida no Ceasa. Por causa da forte concorrência na Capital, a alternativa foi passar a abastecer os mercados da região.
Outras questões preocupam Tsuneo. Há algum tempo os jovens não têm interesse em viver lá: querem ir embora. Os casamentos em Yuba também estão cada vez mais difíceis, porque muitos têm algum grau de parentesco. "Está chegando a época em que será necessário abrir as portas. Será difícil, mas necessário."
Algumas mudanças já estão acontecendo. "Hoje, temos internet e vemos notícias sobre o Japão na TV a cabo", diz Satiko Yuba, de 58 anos. "O intercâmbio é importante, mas continuamos com nossa filosofia. Plantar, orar e fazer arte são nosso tripé."
Turismo
Há os que querem fazer intercâmbio cultural. E também os interessados em férias diferentes. Conhecida no mundo inteiro, a comunidade Yuba recebe turistas do Japão e de várias partes da Europa. Pessoas como os namorados Myo Shimika, de 25 anos, e Hitoshi Iwashita, de 28, que descobriram a fazenda em um programa da televisão japonesa.
Eles ficaram quatro meses no Yuba, em 2005. Em troca da hospedagem, prestaram serviços à comunidade. Escritora e jornalista no Japão, Myo passou a trabalhar na lavoura. Nas horas vagas, ensinava computação para as crianças. Falava com elas em japonês, a língua oficial em Yuba. "O mais importante foi a experiência de viver em comunidade. No Japão, as famílias são muito pequenas", conta Myo. "Eu precisava conhecer essas pessoas que vivem de forma comunitária, isoladas do resto do mundo", completa Hitoshi.
A professora Massako Moriwaki, de 34 anos, não sabia da existência de Yuba até sua chegada ao Brasil, em 2005, para ensinar japonês. E se surpreendeu com a vida simples na comunidade. "A facilidade com que dividem seus pertences é algo maravilhoso e impressionante." Encantada, Massako decidiu morar na fazenda. "Percebi como estava cansada de tanta tecnologia, da supervalorização do dinheiro."
Ela diz que o "jeito japonês de ser" em Yuba é muito antiquado. "Ao preservar fielmente os costumes dos fundadores, os moradores daqui acabam sendo mais 'japoneses' do que os japoneses atuais."
Berrante
Quando Merina Yasaki, de 63 anos, toca o berrante, todos já sabem: a comida está na mesa. O sorriso é constante em seu rosto, apesar da enorme responsabilidade de alimentar diariamente 60 pessoas. Poucos itens são comprados fora: açúcar, trigo, chá, óleo e sal. "Sei que custam caro, mas não tenho idéia dos preços", conta. "Meu trabalho é cuidar da fome dos outros."
Domingo, dia de descanso na comunidade, é o mais cansativo para ela. Afinal, todos querem algo especial, com direito a doces no lanche da tarde. E ela corresponde com bombas e bolos.
Merina tem quatro filhos e sempre viveu em Yuba, que deixou apenas para fazer viagens ao Japão. "Se um dia a comunidade acabar,vou ficar muito triste", afirma. "Não sei se vai acabar, mas às vezes isso pode acontecer."